investigación

O processo de envelhecimento de uma pessoa com autismo na perspectiva do cuidador: estudo de caso

Recebido: 20 de agosto de 2023 • Enviado para modificações: 8 de novembro de 2023 • Aceito: 14 de janeiro de 2023

Reis, V. R. de J., Novelli, M. M. P. C. & Jurdi, A. P. S. (2024). O processo de envelhecimento de uma pessoa com autismo na perspectiva do cuidador: estudo de caso. Revista Ocupación Humana, 24(1), 50-63. https://doi.org/10.25214/25907816.1674

El proceso de envejecimiento de una persona con autismo desde la perspectiva del cuidador: estudio de caso

The aging process of a person with autism from the caregiver’s perspective: A case study

Vitória Revnei de Jesus Reis 1

Marcia Maria Pires Camargo Novelli 2

Andrea Perosa Saigh Jurdi 3

Reis, V. R. de J., Novelli, M. M. P. C. & Jurdi, A. P. S.

1 Graduanda do curso de Terapia Ocupacional, Universidade Federal de São Paulo. Santos, São Paulo, Brasil. revnei.vitoria@unifesp.br

https://orcid.org/0000-0002-2856-3425

2. Terapeuta ocupacional. Mestre e doutora em Ciências da Saúde. Professora, Universidade Federal de São Paulo. Santos, São Paulo, Brasil. mnovelli@unifesp.br

https://orcid.org/0000-0002-2058-4950

3. Terapeuta ocupacional. Mestre e doutora em Psicologia Escolar e Desenvolvimento Humano. Professora, Universidade Federal de São Paulo. Santos, São Paulo, Brasil.

a.jurdi@unifesp.br

https://orcid.org/0000-0002-1111-5562

Resumo

O artigo propõe a discussão sobre o cotidiano e as ocupações de uma pessoa adulta com autismo. Neste sentido, apresenta-se um estudo que buscou compreender como se estrutura o cotidiano de uma mulher adulta com autismo, a partir da perspectiva de um dos cuidadores principais. Trata-se de um estudo qualitativo, do tipo estudo de caso, realizado em Santos, São Paulo, Brasil. A partir de uma entrevista semiestruturada, foram selecionadas e analisadas as categorias: atividades cotidianas e ocupações e desafios enfrentados pela pessoa e sua família. Os resultados destacam a importância de criar espaços de discussão que abordam diferentes maneiras de vivenciar a vida adulta e o processo de envelhecimento com autismo, além de dialogar sobre formas de envelhecer ativamente, participando das atividades da comunidade, exercendo a cidadania e acessando direitos. Os resultados também apontam a necessidade de construção de serviços que apoiem a transição ao longo da vida de pessoas que apresentam condição do espectro do autismo, além de estimular profissionais a desenvolverem ações de cuidado voltadas às demandas específicas dessas pessoas e suas famílias.

Palavras-chave: adulto, Terapia Ocupacional, autismo, atividades cotidianas

Resumen

El artículo propone una discusión sobre la vida cotidiana y las ocupaciones de personas adultas con autismo. En este sentido, se presenta un estudio que buscó comprender cómo se estructura la vida cotidiana de una mujer adulta con autismo, desde la perspectiva de uno sus cuidadores principales. Se trata de un estudio cualitativo, del tipo estudio de caso, realizado en Santos, São Paulo, Brasil. A través de una entrevista semiestructurada, se seleccionaron y analizaron las categorías: actividades cotidianas y ocupaciones, y desafíos enfrentados por la persona y su familia. Los resultados destacan la importancia de crear espacios de discusión que aborden diferentes formas de experimentar la vida adulta y el proceso de envejecimiento con autismo. Además, abogan por el diálogo sobre formas de envejecer activamente, participando en las actividades de la comunidad, ejerciendo la ciudadanía y accediendo a los derechos. También se señala la necesidad de construir servicios que apoyen la transición a lo largo de la vida de las personas que tienen condiciones del espectro autista, así como de estimular a las y los profesionales a desarrollar acciones de cuidado orientadas a las demandas específicas de estas personas y sus familias.

Palabras clave: adulto, Terapia Ocupacional, autismo, actividades cotidianas

Abstract

The article proposes a discussion on the daily life and occupations of an adult with autism. In this regard, a study that sought to understand how the daily life of an adult woman with autism is structured, from the perspective of one of the main caregivers, is presented. This was a qualitative study, a case study, conducted in Santos, São Paulo, Brazil. Through a semi-structured interview, categories such as daily activities and occupations, and the challenges faced by the individual and their family were selected and analyzed. The results emphasize the importance of creating spaces for discussion that address different ways of experiencing adulthood and the aging process with autism. Furthermore, it advocates for dialogue on active aging, participating in community activities, exercising citizenship, and accessing rights. The findings also highlight the need for the development of services that support transitions across the lifespan of people with autism spectrum conditions and encourage professionals to develop care actions aimed at the specific demands of these people and their families.

Keywords: adult, Occupational Therapy, autism, activities of daily living

Introdução

O processo de envelhecimento de pessoas com deficiência tem sido um tema cada vez mais debatido no âmbito da sociedade, das associações de pais e familiares e na academia e deve ser pensado ainda durante a vida adulta, analisando o processo de transição, baseado no pressuposto da longevidade, como proposto por Kalache (2014). A idade adulta traz desafios importantes para as pessoas com deficiência e para as famílias que cuidam: educação, trabalho, participação social e independência para realizar as atividades cotidianas.

Em relação às pessoas autistas é preciso destacar as mudanças que têm ocorrido nos últimos anos e devem ser consideradas no estudo sobre seus processos de envelhecimento. O termo Transtorno do Espectro Autista é considerado um transtorno do neurodesenvolvimento, caracterizado pela dificuldade na comunicação e interação social e por padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses e atividades (American Psychiatric Association, 2014; Lin et al., 2023). Contudo, Lamper-Grassi (2022) contrapõe a utilização do termo transtorno para definir o autismo ao afirmar que este termo expressa enfermidade e que devemos entender a temática autista para além de suas condições clínicas. O autismo deve ser compreendido como um problema político e social mais amplo. Nesse sentido, o conceito de neurodiversidade tem sido utilizado para descrever as diferenças do funcionamento cerebral das pessoas, afirmando que não existe uma única ou uma maneira correta das pessoas perceberem e responderem ao mundo. Nessa perspectiva, autismo é considerado uma condição e não um transtorno.

Em relação às pesquisas na área, estudos recentes demonstram a lacuna que existe em pesquisas, práticas e políticas quando nos voltamos para a população adulta e idosa com autismo (Edelson et al., 2021; Hwang et al., 2020; Lin et al., 2023). A lacuna nas pesquisas pode estar relacionada a indivíduos adultos que se defrontam com avaliações inadequadas e/ou incompletas, fator que cria barreiras para acessar, analisar e compreender os diversos contextos e demandas desses indivíduos (Lin et al., 2023). Além disso, o desconhecimento da condição autista também dificulta a possibilidade de reorganização do cotidiano e adaptação das atividades, retardando o processo de autoconhecimento e cuidado deste grupo (Ruggieri & Gómez, 2018).

Visto que as alterações cotidianas são acentuadas e aceleradas durante o processo de envelhecimento, vale ressaltar que esta fase é afetada não somente pelas condições genéticas, mas também pelo meio social e hábitos desenvolvidos ao longo da vida. É variável de acordo com cada contexto e pode ser mais gradativo para algumas pessoas e mais acelerado para outras. São diversos os fatores que o afetam, como: relações familiares, participação social, capacidade de desempenhar atividades com autonomia e independência, dentre outros (Fechine & Trompieri, 2012).

Netto (2016) ressalta a inexistência de um marcador biofisiológico para o envelhecimento, fato que justifica a insegurança para adotar uma única definição para os múltiplos processos de envelhecimento. A análise possível é a de que existem modificações significativas ocorrendo nesta etapa da vida, que diminuem a capacidade de adaptação ao ambiente e acentuam a vulnerabilidade do indivíduo.

No Brasil, a legislação e políticas públicas voltadas para as pessoas idosas consideram para este segmento populacional indivíduos acima de 60 anos. No entanto, a pesquisa desenvolvida por Hwang et al. (2020) justifica a importância de nos voltarmos para a população acima de 40 anos com autismo para compreendermos o processo de envelhecimento, uma vez que permite uma análise da saúde, bem-estar e participação. Os autores justificam a inclusão de adultos maduros na pesquisa devido à escassez de pesquisas nesta faixa de idade.

Estudos identificados na literatura apontaram que o processo de envelhecimento de indivíduos com a condição do autismo é, em muitos casos, acompanhado de processos demenciais e doenças degenerativas, dificultando a tomada de decisão e reduzindo a autonomia deste grupo (Powell et al., 2017; Ruggieri & Gómez, 2018). Para Ruggieri e Gómez (2018), “a maioria, incluindo, em alguns casos, até os indivíduos mais hábeis, não alcança vida independente e/ou emprego e, com frequência, passam por problemas de saúde mental, especialmente ansiedade e transtornos de humor” (p. 4).

Outro aspecto importante, destacado no estudo de Talasca et al. (2020), voltado para a compreensão da experiência de enfrentamentos da família, é a necessidade de apoio para as cuidadoras, em sua maioria, mães. Cuidadores/as familiares não recebem suporte adequado para proporcionar os cuidados necessários e atender as necessidades da pessoa com autismo. E, mesmo famílias com condições financeiras mais abastadas, enfrentam dificuldades neste cuidado, uma vez que o estudo ressaltou que uma condição econômica mais favorável nem sempre melhora a qualidade de vida das famílias e das mães cuidadoras (Talasca et al., 2020).

A partir de uma perspectiva biopsicossocial e de uma abordagem sistêmica e bioecológica, o autismo deve ser compreendido no contexto de múltiplos fatores que se articulam intrinsecamente, trazendo para a análise a vida real. Nessa perspectiva, é preciso incluir a pessoa e ambientes relevantes que interagem ao longo da vida e do tempo, considerando o envelhecimento e autismo para além do indivíduo, incluindo aspectos de relacionamento interpessoal, familiar, comunidade, estruturas políticas e a sociedade e cultura que o indivíduo pertence (Edelson et al., 2021).

Para o campo da Terapia Ocupacional, a vida cotidiana, as atividades e ocupações tornam-se elementos de investigação para produção de conhecimento acerca do processo de envelhecimento de pessoas com autismo. Salles e Matsukura (2016) referem que a ocupação é um processo ativo de viver a vida cotidiana, do seu início ao final, como um processo ativo de cuidar de si mesmo e dos outros, de desempenhar tarefas da vida cotidiana, aproveitar a vida (lazer) e contribuir para a produção social e econômica da comunidade (produtividade).

Conceituado pela Estrutura da Prática da Terapia Ocupacional, pode-se afirmar a importância das ocupações na vida cotidiana, considerando que:

As ocupações são centrais para a saúde, identidade e sentido de competência de um cliente (pessoa, grupo ou população) e têm um significado e valor particular para esse cliente. Para a Terapia Ocupacional, as ocupações referem-se às atividades diárias que as pessoas realizam como indivíduos, em famílias e com comunidades para preencher tempo e trazer sentido e propósito à vida. (Gomes et al., 2021, pp. 9-10)

Este artigo tem por objetivo apresentar os resultados de uma pesquisa que buscou compreender como se estrutura o cotidiano e o cuidado de uma mulher adulta com dependência funcional, que apresenta condição do espectro do autismo, a partir da perspectiva de um dos cuidadores principais. Além disso, compreender se as ocupações que compõem a rotina promovem participação e identificar atividades cotidianas que favoreçam independência e autonomia.

Método

Trata-se de um estudo exploratório e qualitativo do tipo estudo de caso, uma técnica de pesquisa abrangente, com destaque para um caso único. O método permite explicar, descrever, ilustrar e explorar temáticas empíricas, seguindo um conjunto de procedimentos pré-estabelecidos (Yin, 2001).

O instrumento de pesquisa utilizado para a produção de dados foi a entrevista semiestruturada, que nos permite explicar o ponto de vista do participante, suas experiências particulares, a forma como pensa, interpreta ou explica seu comportamento, diante da análise de uma conversa intencional, no contexto natural que é estudado (Coutinho, 2021). Os dados foram produzidos a partir de um roteiro elaborado previamente. O roteiro teve o intuito de direcionar a conversa, mas não restringi-la, deixando espaço para que o participante incluísse informações relevantes, enquanto agente ativo e crítico do processo (Minayo, 2014).

O roteiro foi composto por questões para coleta de dados sociodemográficos, além de perguntas acerca das atividades cotidianas, acesso ou não acesso a espaços de lazer e questões com o objetivo de compreender a qualidade e o tempo de descanso. Dividido em quatro seções: identificação inicial; escolaridade; núcleo familiar; e questões sobre o cotidiano, baseadas no grupo de ocupações conceituado pela Estrutura da Prática da Terapia Ocupacional (Gomes et al., 2021)

Como critério de inclusão: ser familiar ou cuidador principal de uma pessoa com autismo acima de 45 anos e ser residente no município de Santos, São Paulo, Brasil. Foi utilizado o método bola de neve, considerando a dificuldade de acesso ao grupo populacional de adultos e idosos com autismo. A partir da identificação de uma semente, primeira pessoa que iniciou a rede de indicações, foi possível identificar e convidar voluntários e suas famílias (Vinuto, 2014).

Outra estratégia de divulgação utilizada foi as redes sociais, site e mídias da Universidade Federal de São Paulo (Instagram®, WhatsApp®), além de e-mails para instituições especializadas de Santos, que foram mapeadas como locais de possíveis atendimentos às pessoas adultas e idosas com autismo. Não houve retorno direto das instituições, no entanto, através do método bola de neve, construiu-se uma rede de indicações e, a partir do contato com a Coordenadora de Políticas para Pessoas com Deficiência de Santos, que indicou uma instituição localizada também no município de Santos desde 2009. Realizou-se uma aproximação inicial para contato com os usuários. A coordenadora da instituição respondeu às pesquisadoras e aceitou divulgar a pesquisa entre as famílias que utilizam seus serviços. Através desta divulgação, o convite foi aceito por uma das famílias, sendo o pai, o principal cuidador.

A instituição presta atendimento psicoterapêutico a adultos e idosos com autismo. As oficinas que oferecem aos usuários são conduzidas por uma equipe multiprofissional formada por terapeuta ocupacional, fisiologista, pedagoga, músico e monitores, que buscam estimular habilidades, promover socialização e aquisição de conhecimentos diversos.

A entrevista foi realizada no mês de julho de 2023 e registrada por meio do gravador de áudio. A entrevista privilegiou o discurso oral e a escuta ativa por parte da pesquisadora, escuta esta que se tornou fundamental durante a fase posterior, de análise dos dados. O áudio gravado foi transcrito e analisado com base na literatura, segundo o método da análise de conteúdo temática. De acordo com este método, são selecionados trechos das entrevistas, segundo categorias derivadas do roteiro. Esses trechos permitiram identificar núcleos de sentido que, por sua vez, possibilitaram a elaboração de temas gerais (Gomes, 1994).

Considerações éticas

A entrevista foi realizada na instituição com o pai e foi gravada com a anuência dele. Tanto o participante da pesquisa, como sua filha serão nomeados com nomes fictícios para preservar o sigilo e confidencialidade..

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo sob o n. 66554123.8.0000.5505 e o participante assinou o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, para assegurar a privacidade das pessoas envolvidas e garantir a autorização do estudo.

Resultados

Os resultados obtidos por meio da entrevista, após análise, foram categorizados em duas categorias: atividades cotidianas e ocupações, e desafios enfrentados. Os núcleos temáticos foram selecionados considerando o destaque e as reflexões feitas ao longo da entrevista pelo entrevistado.

O Sr. Roberto tem 81 anos e é pai de Beatriz, uma mulher de 47 anos, não-alfabetizada, com comprometimento na comunicação verbal, que sempre esteve inserida em instituições de ensino especializado. Ela reside com os pais, seus cuidadores principais, e tem um irmão que não mora na mesma casa, mas participa dessa rede de cuidados aos finais de semana.

Segundo o pai, o irmão faz questão de sair com a irmã aos finais de semana e dar suporte aos pais sempre que possível e necessário.

Sábado e domingo, quando ele (o irmão) está de folga, ele vai lá em casa, sai com ela, de carro ou de ônibus e a gente vai tocando desse jeito. (Excerto da entrevista)

O Sr. Roberto é o cuidador principal e com o qual Beatriz expressa ter mais confiança e vínculo. A mãe, pelos cuidados com a casa e com familiares adoecidos, não está muito presente nas atividades cotidianas. Para o pai, esse laço entre os dois é resultado do tempo que passam juntos em casa, em atividades de lazer e idas à instituição especializada.

Em boa parte dos casos de adultos e idosos com autismo, as instituições aparecem como importante recurso da rede de suporte. Por esta razão, destaca-se a trajetória percorrida nas instituições especializadas ao longo da vida de Beatriz.

Sr. Roberto não sabe precisar a idade que Beatriz foi diagnosticada, mas refere uma peregrinação por médicos diversos e diagnósticos como o de paralisia cerebral. Pelo que foi possível compreender, Beatriz foi diagnosticada com autismo pouco antes da adolescência. Desde que a família recebeu o diagnóstico, o Sr. Roberto relata que o médico que os acompanhava insistia para que Beatriz fosse inserida no ensino regular. No entanto, Sr. Roberto relata que existia o receio do despreparo dos profissionais que a atenderiam, da falta de estrutura da escola e do sistema de ensino. A dificuldade relatada pelo Sr. Roberto era vivenciada por outras famílias, pois sabe-se que há 40 anos atrás, o autismo ainda era desconhecido. Com o avanço das pesquisas e as políticas de inclusão escolar, houve um avanço na inclusão de crianças, jovens e adultos com autismo nas escolas (Ministério da Educação, 2020).

Evidenciou-se para esta família, a entrada de Beatriz em instituições especializadas. Na instituição que frequenta hoje, Beatriz realiza atividades que a ajudam a desenvolver autonomia, interagir com outras pessoas, além de estimular o desenvolvimento de outras habilidades, como: pintar, desenhar, cozinhar etc. Como relatado pelo pai,

Algumas [outras instituições] forçaram caderno, lápis, caneta e a escrita, mas não ia. Ela só sabia fazer o círculo. Hoje interessa aqui [ONG que frequenta] porque ela chega e tem atividades diferentes. (Excerto da entrevista)

Sabe-se que as organizações não-governamentais são um importante recurso de cuidado para famílias que não conseguem vagas em instituições de educação especial municipais ou mesmo para aquelas que precisam de outra alternativa quando a adaptação não é efetiva, seja por questões de horários ou outras demandas, considerando casos como o de Beatriz e sua família, em que seu principal cuidador é uma pessoa idosa de 81 anos, que também precisa de cuidados.

Atualmente, Beatriz é assistida por seu médico que a acompanha rotineiramente. Realiza exames e consultas quando necessário e, segundo seu pai, “tem uma saúde boa”. Além disso, tem feito uso de medicações para dormir melhor durante à noite e diminuir a agitação durante o dia.

.

Atividades cotidianas e ocupações

Ocupações são as atividades desempenhadas diariamente que dão sentido ao cotidiano: atividades de vida diária, atividades instrumentais de vida diária, descanso e sono, lazer, gestão da saúde, trabalho, educação, brincar e participação social (Gomes et al., 2021). As ocupações que compõem o cotidiano de Beatriz, baseado nos relatos de seu pai, são as atividades de vida diária, descanso e sono e lazer.

Sr. Roberto conta sobre a importância das atividades realizadas ao longo do dia que garantem o cansaço da filha para um boa-noite de sono, pois sem elas, Beatriz fica agitada e a dinâmica da família é afetada. O fato de Beatriz não conseguir ter um sono tranquilo, impacta também no descanso dos pais e na forma como vão desempenhar suas ocupações no dia seguinte.

Beatriz precisa de apoio substancial para realizar as atividades cotidianas, tais como vestir-se, alimentar-se e tomar banho. Consegue realizá-las, mas precisa de orientação e supervisão, pois apresenta dificuldade no planejamento e organização das atividades citadas. Em relação à divisão de tarefas da casa, Beatriz participa muito pouco, como refere Sr. Roberto na fala abaixo:

A gente faz. Ela pega a vassoura e o varre no canto, mas não tem noção de como varrer direito, colocar na pá e depois no lixo. Ela não quis aprender e ninguém tinha tempo de ensinar. O pai e a mãe não são boas pessoas para ensinar porque é pouco tempo, então acaba pegando e fazendo. (Excerto da entrevista)

Nas atividades externas, como ir a lugares próximos de casa, como padaria, mercado, farmácias, Beatriz sempre sai acompanhada e com supervisão. O pai relata que desde a infância Beatriz apresentou dificuldades motoras e agitação:

Porque você não confia nela para soltar. Eu fiz isso durante um tempo. Ela começou a andar com quatro anos e meio. Uns anos depois, com uns seis, sete anos, eu fui ensinar ela a andar na rua porque ela não andava, ela só corria quando estava fora de casa. Em qualquer lugar que você fosse, você tinha que segurar na mão dela pra não correr. (Excerto da entrevista)

Atualmente, Beatriz anda de ônibus e caminha pela cidade com o pai ou com o irmão. Estes passeios são interrompidos somente em dias em que Beatriz apresenta mais dificuldade para sair de casa:

De tudo [a pé, ônibus, carro], né? Há pouco tempo atrás eu saía de casa, eu ia para a cidade andando com ela, era uma fase antes da fase de cair. Tinha confiança. A gente ia até a prefeitura de Santos, ali atrás da prefeitura tem uma casa de doces. Eu comprava um pacote de pipoca e voltava pra casa de ônibus. A gente andava muito. [...] O pessoal que vai na rua, ela fala, fala, fala. Interage com todo mundo. Então, para ela, isso é bom. (Excerto da entrevista)

Nas atividades de lazer, Beatriz mostra preferência por andar na praia e aprecia visitar igrejas quando estão vazias. O pai relata que ela não fica em ambientes com barulho e com muitas pessoas circulando.

Olha, ela não gosta muito de certas coisas, por exemplo, outro dia eu estava no ônibus e ia descer no Gonzaga [bairro da cidade] e ela não aceitou porque tinha muita movimentação na praça. Movimentação, fogos, muita gente, essas coisas, ela não aceita. E esse é um dos motivos de eu fazer uma poupança e conseguir comprar um imóvel a mais. Porque ela fala ‘pra praia, papai’. (Excerto da entrevista)

O aspecto importante apontado pelo pai, foi a realização de atividades de lazer de acordo com os desejos da filha. Uma ida à praia, que não é para sentar-se em uma cadeira e passar horas tomando sol, mas sim para dar uma volta, interagir com o ambiente e outras pessoas e voltar para casa minutos depois. Ele reforça a importância de adaptar as atividades para que a pessoa possa participar de acordo com o que é confortável para si.

Hoje ela caminha na praia, água no tornozelo. Então hoje ela gosta de caminhar na praia, de olhar o mar da janela do apartamento. (Excerto da entrevista)

A família possui um imóvel em outra cidade litorânea da Baixada Santista e o pai garantiu que tivesse vista para a praia, pois nem sempre Beatriz está disposta a sair de casa, mas a família compreende o quão benéfico é para ela ver o mar, sentar-se em frente à janela, ver a movimentação e as pessoas caminhando pela orla. A atividade pode ser prazerosa mesmo quando realizada dentro de casa.

O lazer para as pessoas adultas com autismo e que precisam de apoio para realizar suas atividades ainda é considerado um desafio para as famílias e cuidadores principais. Sr. Roberto traz a compreensão de que se faz necessário adaptar atividades para conseguir promover a participação sem gerar sofrimento ou ansiedade.

Desafios enfrentados

Nesta categoria, foram analisadas as diferentes barreiras enfrentadas ao longo da vida e os desafios que surgem, especificamente com o processo de envelhecimento dos cuidadores principais. Alguns pontos importantes destacados durante as falas de Sr. Roberto: falta de acessibilidade, dificuldade na relação com profissionais da saúde, dificuldade de compreender os desejos e as necessidades do familiar com autismo, cansaço dos cuidadores, preocupação com o futuro, rede de apoio fragilizada, preocupação com a idade e quem assumirá o cuidado com o filho/a.

Ter que reafirmar a condição do espectro autista e as demandas para os diferentes profissionais que acompanham Beatriz é desgastante, segundo Sr. Roberto,

É convencer os médicos, a gente tem que tentar explicar para eles o que a gente quer, se não ele faz o carimbo e te manda embora. E não é isso que a gente quer. (Excerto da entrevista)

Outro desafio se refere ao fato de encontrar-se com profissionais que não estão dispostos a exercitar a escuta ativa, acolhedora e de fato atender aquela pessoa de acordo com suas demandas específicas, não seguindo somente seus protocolos enrijecidos.

Sr. Roberto também pontua fortemente o desafio e a angústia de não compreender os desejos da filha, quando diz:

Eu não sei o que ela precisa, ela não pede nada, não pede um batom, não pede esmalte, não pede um sapato alto, não pede nada, só pede comida. (Excerto da entrevista)

Outra preocupação é a do cuidado no futuro, com quem a filha ficará, caso algo aconteça a eles ou, por alguma razão, não tenham mais condições de cuidar?

Com essa idade, vem a preocupação. Tem horas que bate a preocupação: com quem fica? Ela tem 47, mas tem saúde relativamente boa. (Excerto da entrevista)

A preocupação surge, pois para além da rede de apoio familiar, é preciso pensar em instituições que poderiam ser usadas como recurso de cuidado. Sr. Roberto constata que não existe uma estrutura preparada para a transição da vida adulta para o envelhecimento das pessoas com autismo, uma vez que que as instituições de longa permanência do município não contam com profissionais especializados para atender as demandas específicas e as residências inclusivas estão preparadas para atender indivíduos com até 59 anos. Destaca-se então, a urgência de propor uma rede de cuidado para pessoas mais velhas dentro do espectro, o planejamento com as famílias e a orientação profissional para construir os melhores caminhos para o cuidado.

Entre os desafios, Sr. Roberto destaca a falta de uma rede de apoio familiar. Apesar do afeto extremo demonstrado por ele e, mesmo com o apoio do filho, o casal sente falta de um suporte maior, uma rede de apoio mais ampliada para diminuir a sobrecarga deste cuidado, principalmente aos finais de semana, período em que Beatriz passa mais tempo em casa.

Discussão

Os resultados possibilitaram verificar que Beatriz tem uma condição de dependência e um cotidiano restrito às atividades domiciliares e na instituição que frequenta diariamente. O cuidado está restrito à família nuclear e com rede social empobrecida, sobrecarregando a família. O apoio que Beatriz necessita em suas atividades, demanda do Sr. Roberto, cuidador principal, um cuidado em tempo integral, que resulta no cansaço citado por ele. A preocupação com o futuro de Beatriz é algo concreto e verbalizado pelo pai, além da dificuldade de compreender as necessidades e desejos da filha, ele lida também com a ausência de uma rede de apoio para partilhar o cuidado.

Atividades cotidianas e ocupações

Diferente de outros estudos que apontam a figura feminina como cuidadora principal (Valenzuela, 2023), esta pesquisa trouxe o pai como responsável pelos cuidados da filha e com quem ela tem o vínculo mais forte. Em consonância com os apontamentos de Talasca et al. (2020), a dedicação integral do cuidador ao filho com autismo leva à uma imersão completa à realidade da condição e pode restringir suas atividades laborais, sociais e de autocuidado. Conforme as oportunidades de participação social da pessoa com autismo diminuem, a família também experimenta uma diminuição de suas atividades sociais, deixando de frequentar espaços de lazer, casa de familiares, espaços religiosos, buscando realizar atividades dentro de casa, com o núcleo familiar mais próximo.

É relevante ressaltar que Almeida (2018) indica que, mesmo nas atividades realizadas fora do domicílio, não há interação interpessoal e inserção social, pois geralmente as atividades são cercadas pela família mais próxima e não geram oportunidades para novas relações. Neste sentido, considera-se importante pensar estratégias que permitam a criação de uma rede social de suporte, tanto para apoiar a pessoa com autismo, quanto para sua família.

Castro (2022) discorre sobre enxergar a pessoa para além do seu diagnóstico, destacando a urgência da criação de mecanismos que promovam condições para a plena participação e envolvimento. Neste sentido, existe também a necessidade de acompanhamento e orientação para que a família compreenda que a condição não reduz a possibilidade de participação social e, até mesmo, das atividades, como limpar a casa, organizar os próprios objetos pessoais, decidir as próprias roupas. O tempo de dedicação ao ensino poderá ser maior, mas com orientação, é um processo possível, pois fazer pela pessoa reduz sua independência.

A escola, as instituições e os espaços que permitem a convivência com grupos diferentes aparecem como fator importante para a inserção social na vida adulta. Estudar ou realizar outras atividades dentro da instituição frequentada é aproximar-se de uma possível rede de apoio, com colegas e amigos. Nota-se que a dinâmica dos papéis sociais é fundamental para inserir o indivíduo adulto em grupos, promovendo participação ativa, autonomia e individualização. Nesta fase, a atividade laboral, quando exercida, também aparece como fator determinante para melhora da autoestima e senso de participação social (Almeida, 2018).

Nesta perspectiva, Morais et al. (2022) apontam para o cuidado necessário para que fatores, que são protetivos à saúde mental, não sejam estressantes para a pessoa com autismo, como: amigos, realização de atividades de vida diária ou mesmo atividades de lazer, já que para todas, é necessário a dedicação de certo nível de energia que, para uma pessoa com autismo, pode ser desgastante. Entretanto, esta preocupação não deve ser impeditiva. Para isso, existe o acompanhamento de profissionais que conduzem os processos de inserção de maneira cuidadosa, aproximando o indivíduo de novos grupos e atividades da comunidade gradualmente, trabalhando as habilidades sociais e de comunicação, além da autonomia. Como referem Salles e Matsukura (2016), viver a vida cotidiana é também um processo de cuidado consigo e com os outros.

Entrelaçado a este processo de inclusão na vida cotidiana em diferentes grupos e atividades, ressalta-se o conceito da neurodiversidade que salienta que uma conexão neurológica atípica não se caracteriza por uma doença a ser tratada e curada. Trata-se, sim, de uma categoria de diferença humana que deve ser considerada como outras diferenças, tais como as raciais, sexuais, dentre outras. Defende o fortalecimento da rede de apoio, aproximando a comunidade em torno da luta pela inclusão nos mais diversos espaços (Reis et al, 2016; Araujo et al., 2023).

A vida cotidiana tem a potência de acessar experiências, relações, afetos, sonhos, modos de pensar e agir e, também, preconceitos, violências e discriminações. Para Galheigo (2020), saber e experiência são o que definem o cotidiano.

Desafios enfrentados

A sobrecarga dos cuidadores destaca o comprometimento na qualidade de vida de familiares de pessoas com a condição do autismo, as mudanças vivenciadas no cotidiano e as alterações na vida pessoal e profissional, que tendem a repercutir por toda a vida, como relatado por Sr. Roberto ao citar que ainda hoje encontra dificuldade de desempenhar suas atividades nos momentos em que Beatriz não está assistida pela instituição. No caso de indivíduos já adultos, a sobrecarga dos cuidadores costuma ser ainda mais evidente, considerando que vivenciam também seus próprios processos de envelhecimento, demonstrando cansaço e a fragilização da rede de apoio, que costuma ser limitada aos outros filhos, quando existente. As necessidades familiares as quais o cuidador precisa dar conta diminuem o tempo que tem disponível para si, podendo afetar sua saúde e o conduzindo a reorganização de seus hábitos (Cavalcante et al., 2021; Prychodco & Camargo Bittencourt, 2022). As angústias apresentadas pelo Sr. Roberto reforçam preocupações apontadas no estudo de Prychodco e Camargo Bittencourt (2022), ao analisarem os principais desafios no cotidiano de famílias que cuidam de crianças e adolescentes com autismo, evidenciando a realidade vivida pelas famílias ao longo de toda a vida desses indivíduos.

Faz-se necessário a promoção de espaços que discutam possibilidades diferentes de vivenciar a vida adulta e o processo de envelhecimento das pessoas com autismo, dialogar sobre formas de envelhecer ativamente, participando das atividades da comunidade, exercendo a cidadania e acessando direitos (Lin et al., 2023). Os resultados deste estudo visam contribuir também com a construção de serviços que apoiem os processos de transição ao longo da vida, além de estimular profissionais a desenvolverem técnicas voltadas às demandas específicas. Neste cenário, é importante discutir acerca do preparo técnico de profissionais (não somente da saúde) que atendem pessoas com autismo e seus familiares, profissionais que estejam preparados para acolher, cuidar e orientar, diminuindo a dificuldade apresentada pelos pais na comunicação com os filhos e acerca dos desafios que enfrentam. Que estes profissionais estejam prontos para ouvir e atender o indivíduo e sua família de acordo com as demandas específicas do caso. São direitos receber suporte adequado de profissionais especializados, além da saúde, na educação, no transporte, no trabalho, no lazer, na vida civil e na aposentadoria (Bertin, 2022).

Neste sentido, também é indispensável relembrar a fragilidade das políticas públicas. Spínola (2014) diz que para pessoas com condição do espectro do autismo, a implementação de políticas específicas é garantia de dignidade humana e chance de inclusão social, pontos destacados anteriormente. Também ressalta que o acesso ao tratamento adequado e à educação especializada são importantes. De acordo com a Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva no Brasil, a escola deve adaptar-se para possibilitar a inclusão de alunos com condições diversas, incentivando o respeito à individualidade e a diversidade (Ministério da Educação, 2020).

Além disso, os desafios e preocupações futuras pontuados por Sr. Roberto mostram a ausência de orientação acerca do atendimento às pessoas que precisam de cuidado assistencial depois de adultas, principalmente durante o processo de envelhecimento, dando luz à ausência de serviços que assumam o cuidado integral (Cavalcante et al., 2021).

Uma outra vertente de análise é a questão de gênero, que deve ser analisada a partir da fala do cuidador principal. Brunetto e Vargas (2023) apontam que a ausência de trabalhos sobre meninas e mulheres autistas que não são observadas ou consideradas nem no campo de estudos de gênero, nem no campo dos estudos do autismo. Para os autores, o ciclo de invisibilidade de mulheres autistas passa por pesquisas que, em sua maioria, utilizam amostragens com maioria de homens, resultando em características do “autismo masculino”.

Sr. Roberto não demonstrou preocupação com a sexualidade de Beatriz e o receio da filha ser cuidada por outros. Tal fato revela, talvez, uma dificuldade do pai e cuidador em lidar com essa preocupação ou, pode compreender que Beatriz, por ser uma mulher autista, não tenha sexualidade. Para Ries et al. (2022) mulheres autistas sofrem com a infantilização, pois culturalmente a criança autista é criada para agradar aos outros e ensinada a limitar seus comportamentos ou estereotipias. Desta forma, a menina e mulher autistas desaprendem a dizer não e se tornam mais vulneráveis aos abusos. O isolamento social, a dependência de educadores, cuidadores, o grau de funcionalidade, a impossibilidade de se defender fisicamente e, até de perceber a situação de abuso e/ou violência, torna as mulheres autistas mais vulneráveis a situações de riscos. Em relação à sexualidade, os autores ressaltam que, muitas vezes, as mulheres autistas têm sua sexualidade negada e sofrem com barreiras impostas sobre o prazer corporal.

Conclusão

O estudo de caso trouxe dados importantes acerca das ocupações e do cotidiano de uma mulher com condição do espectro do autismo que apresenta necessidade de apoio substancial para realizar suas atividades de vida diária, atividades instrumentais de vida diária e pouca participação social. Beatriz também apresenta necessidade de suporte para cuidar de sua saúde e realizar atividades de lazer. Sua vida cotidiana encontra-se restrita ao contato familiar e à instituição onde fica em período integral. Atualmente, suas atividades de lazer concentram-se nos finais de semana, através de passeios de carro pela cidade com o pai ou o irmão e viagens para a casa da família em outra cidade do litoral paulista, onde Beatriz gosta de caminhar pela praia e ver a circulação das pessoas pela janela de seu apartamento.

É importante salientar que a heterogeneidade da população com condição do espectro do autismo não permite inferir que este seja um padrão no envelhecimento destas pessoas. Devido à variabilidade, é possível referir que indivíduos com esta condição podem ter diferentes trajetórias de envelhecimento com pontos fortes e habilidades, bem como desafios e vulnerabilidades e isso precisa ser melhor estudado e compreendido para que se criem as estratégias de cuidado mais adequadas para esse público.

Como limitações do estudo, entende-se que o estudo de caso pode ficar circunscrito a um determinado contexto socioeconômico e cultural e apresentar somente as dificuldades e necessidades de uma única família, mas aponta aspectos importantes para o início de reflexões acerca desta condição.

Outro fator limitador se refere ao instrumento de pesquisa utilizado e a não adaptação de estratégias para incluir Beatriz como participante do estudo, ressaltando o fato de pesquisadores encontrarem estratégias de pesquisa para abordar pessoas com deficiência que têm dificuldade de comunicar-se verbalmente. As pesquisas precisam ter como participantes as pessoas com deficiência, mesmo com esta dificuldade.

Estudos futuros devem se atentar para a importância de garantir a visibilidade e o acesso de mulheres adultas e em processo de envelhecimento com condição do espectro do autismo para que estejam inseridas nos mais diversos espaços e possam contar de sua realidade, desconstruindo a ideia de que é mais seguro ficarem isoladas em casa ou em instituições. Devem também buscar compreender a vida de sujeitos que trabalham, moram sozinhos ou com parceiros/amigos e apontar as possibilidades de vida independente.

Neste sentido, é indispensável reforçar a necessidade de novos estudos acerca das implicações da condição espectro do autismo nos processos de envelhecimento, iniciando o acompanhamento ainda durante a vida adulta, com vistas a compreender também este importante processo de transição. Assim, aumentam-se as informações para embasar uma política pública específica e voltada cuidadosamente às necessidades da população brasileira que vive com autismo, dos que recebem o diagnóstico ainda durante a infância e àqueles que, depois de muita luta, o recebem depois de adultos.

Contribuição das autoras:

A primeira autora participou da criação e elaboração do projeto, fez a investigação e escreveu o artigo. A segunda e a terceira autoras executaram a administração, planejamento e execução do projeto, e participaram da escrita e revisão do texto.

Financiamento:

Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).

Reis, V. R. de J., Novelli, M. M. P. C. & Jurdi, A. P. S.

Reis, V. R. de J., Novelli, M. M. P. C. & Jurdi, A. P. S.

Reis, V. R. de J., Novelli, M. M. P. C. & Jurdi, A. P. S.

Almeida, J. V. D. (2018). O cotidiano e a rede de cuidado de pessoas adultas com transtorno do espectro autista [Trabalho de conclusão de curso, Universidade de Brasília].

American Psychiatric Association. (2014). Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (5ª ed.). Artmed Editora.

Araujo, A. G. R., Silva, M. A. da., & Zanon, R. B. (2023). Autismo, neurodiversidade e estigma: perspectivas Políticas e de inclusão. Psicologia Escolar E Educacional, 27, e247367. https://doi.org/10.1590/2175-35392023-247367

Bertin, C. (2022). Direitos do autista. In D. Kerches (Ed.), Autismo ao longo da vida (pp. 227-236). Literare Books International.

Brunetto, D., & Vargas, G. (2023). Meninas e mulheres autistas: completar o espectro é uma questão de gênero. Cadernos de Gênero e Tecnologia, 16(47), 258-275. https://doi.org/10.3895/cgt.v16n47.15682

Castro, L. R. (2022). Um olhar para o envelhecimento da pessoa com deficiência intelectual: autonomia e independência. Mais 60: Estudos Sobre Envelhecimento, 32(82), 8-19.

Cavalcante, J. L., de Lima Filho, B. F., de Melo, M. C. S., da Silva, A. C. M. B., da Costa Cavalcanti, F. A., & Gazzola, J. M. (2021). Qualidade de vida de autistas idosos: uma revisão narrativa. Ciência em Movimento, 23(46), 65-73.

Coutinho, C. P. (2021). Metodologia de investigação em ciências sociais e humanas: teoria e prática. Almedina.

Edelson, S. M., Nicholas, D. B., Stoddart, K. P., Bauman, M. B., Mawlam, L., Lawson, W. B., Jose, C., Morris, R., & Wright, S. D. (2021). Strategies for research, practice, and policy for autism in later life: A report from a think tank on aging and autism. Journal of Autism and Developmental Disorders, 51(1), 382–390. https://doi.org/10.1007/s10803-020-04514-3

Fechine, B. R. A., & Trompieri, N. (2012). O processo de envelhecimento: as principais alterações que acontecem com o idoso com o passar dos anos. Revista Científica Internacional, 1(20), 106-132.

Galheigo, S. M. (2020). Terapia ocupacional, cotidiano e a tessitura da vida: aportes teórico-conceituais para a construção de perspectivas críticas e emancipatórias. Cadernos Brasileiros de Terapia Ocupacional, 28, 5-25. https://doi.org/10.4322/2526-8910.ctoAO2590

Gomes, D., Teixeira, L., & Ribeiro, J. (2021). Enquadramento da prática da terapia ocupacional: domínio & processo 4ª edição versão portuguesa de occupational therapy practice framework: domain and process 4th edition (AOTA - 2020). Leiria. https://doi.org/10.25766/671r-0c18

Gomes, R. (1994). A análise de dados em pesquisa qualitativa. In S. F. Deslandes, O. C. Neto, R. Gomes, & M. C. de S. Minayo (Orgs.). Pesquisa social: teoria, método e criatividade (pp. 67-80). Vozes.

Hwang, Y. I., Foley, K. R., & Trollor, J. N. (2020). Aging well on the autism spectrum: an examination of the dominant model of successful aging. Journal of Autism Developmental Disorders, 50, 2326–2335. https://doi.org/10.1007/s10803-018-3596-8

Kalache, A. (2014). Respondendo à revolução da longevidade. Ciência & Saúde Coletiva, 19(8), 3306–3306. https://doi.org/10.1590/1413-81232014198.02362012

Lampert-Grassi, M. P. (2022). Personas del espectro autista trastorno o condición. Biblioteca del Congreso Nacional de Chile.

Lin, J., Gaiato, M. H. B., Zotesso, M. C., Silveira, R. da R., & Ferreira, L. (2023). Transtorno do espectro autista e envelhecimento: uma revisão narrativa. Revista Remecs - Revista Multidisciplinar de Estudos Científicos em Saúde, 8(14), 3–11. https://doi.org/10.24281/rremecs2023.8.14.3-11

Minayo, M. C. d. S. (2014). O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. Hucitec.

Ministério da Educação. (2020). PNEE: Política Nacional de Educação Especial: equitativa, inclusiva e com aprendizado ao longo da vida. Secretaria de Modalidades Especializadas de Educação.

Morais, L. M. F., dos Santos, D. M., Cortat, B. O. S., & Machado, A. K. C. (2022). Saúde mental e envelhecimento em pessoas do espectro autista. Anais do IX Congresso Internacional de Envelhecimento Humano. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. https://www.editorarealize.com.br/index.php/artigo/visualizar/86702

Netto, M. P. (2016). História da velhice: histórico, definição do campo e termos básicos. In E. V. Freitas & L. Py (Orgs.), Tratado de geriatria e gerontologia 4ª ed. (pp.74-88). Guanabara Koogan.

Powell, P. S., Klinger, L. G., & Klinger, M. R. (2017). Patterns of age-related cognitive differences in adults with autism spectrum disorder. Journal of autism and developmental disorders, 47(10), 3204–3219. https://doi.org/10.1007/s10803-017-3238-6

Prychodco, R. C., & Camargo Bittencourt, Z. Z. L. (2022). Desafios no cotidiano de famílias com crianças e adolescentes com transtorno do espectro do autismo. Revista de psicologia, 16(63), 204-221. https://doi.org/10.14295/idonline.v16i63.3542

Reis, C., Barbosa, L. M. D. L. H., & Pimentel, V. P. (2016). O desafio do envelhecimento populacional na perspectiva sistêmica da saúde. BNDES Setorial, 44, 87-124.

Ries, I. L., Lima, B. N. C., & Biondi , A. (2022). Conexiones, vulnerabilidades y la lucha de mujeres neurodivergentes por reconocimiento. Razón Y Palabra, 25(112), 32–54. https://doi.org/10.26807/rp.v25i112.1813

Ruggieri, V., & Gómez, J. L. C. (2018). Envejecimiento en personas con trastorno del espectro autista. Medicina, 78, 69-74.

Salles, M. M., & Matsukura, T. S. (2016). O uso dos conceitos de ocupação e atividade na Terapia Ocupacional: uma revisão sistemática da literatura. Cadernos Brasileiros De Terapia Ocupacional, 24(4), 801–810. https://doi.org/10.4322/0104-4931.ctoAR0525

Spínola, G. O. (2014). Autismo: o ideal e o real na efetivação da decisão jurisdicional que implementa políticas públicas. Revista Brasileira de Políticas Públicas, 4(1), 60-68. https://doi.org/10.5102/rbpp.v4i1.2756

Talasca, F. V., Carvalho, A. V. de, Veloso, L. A., & Malaquias, J. H. V. (2020). A família diante da experiência de enfrentamento dos transtornos do espectro autista: uma visão subjetiva. Estudos Interdisciplinares em Psicologia, 11(1), 182–200. http://dx.doi.org/10.5433/2236-6407.2020v11n1p182

Valenzuela, D. G. (2023). El cuidado como cuestión de tiempo: una perspectiva feminista sobre el tiempo cotidiano de cuidadoras de personas adultas con discapacidad. Revista Ocupación Humana, 23(1), 8–23. https://doi.org/10.25214/25907816.1494

Vinuto, J. (2014). A amostragem em bola de neve na pesquisa qualitativa: um debate em aberto. Temáticas, 22(44), 203-220.

Yin, R. K. (2001). Estudo de caso: planejamento e métodos (2ª ed.). Bookman editora.

Referências

Reis, V. R. de J., Novelli, M. M. P. C. & Jurdi, A. P. S.